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ALGUNS ASPECTOS JURÍDICOS

DA LEI Nº 9.271 DE 17/04/96.

Agamenon Bento do Amaral - Procurador de Justiça em Florianópolis-SC. Professor Adjunto de Processo Penal da UFSC - Mestre em Direito.

1. Fundamentos teóricos e doutrinários.

De modo geral, a edição de uma nova norma jurídica ou, mesmo, a edição de um novo diploma legal, provoca, desde logo, reações as mais diversificadas nos operadores do Direito (advogados, juizes, promotores de justiça, delegados de polícia), professores na área do direito e, até nos próprios Tribunais quando da aplicação da disposição legal a um determinado caso concreto.

Assim, à evidência, inúmeras interpretações legais foram suscitadas quando da edição da Lei nº. 9.099/95 (Juizados Especiais Cíveis e Criminais), da Lei nº 9.268 de 01/04/96 (que deu nova redação ao art. 51 do Código Penal), a Lei nº 9.296/96 (que disciplinou as interceptações telefônicas), entre outras, dando por outro lado margem à pronunciamentos judiciais díspares.

Nessa linha de pensamento, a Lei nº 9.271/96 que deu nova redação ao art. 366 do Código Penal, no que concerne ao instituto da revelia, não foi diferente.

Com efeito, a nova redação do mencionado dispositivo ficou assim expressa:

"Art.366 - Se o acusado, citado por edital, não comparecer, nem constituir advogado, ficarão suspensos o processo e o curso do prazo prescricional, podendo o juiz determinar a produção antecipada das provas consideradas urgentes e, se for o caso, decretar prisão preventiva, nos termos do disposto no art. 312" (grifei).

Desde logo, impõe-se algumas considerações de ordem teórico-jurídicas sobre as razões que teriam levado o legislador ordinário à reformulação do mencionado instituto - revelia - previsto no retrocitado dispositivo.

A primeira observação a ser feita, refere-se à constatação no cenário jurídico mundial sobre a necessidade imperiosa de que o réu deva estar presente e representado judicialmente no decurso do processo judicial. Isto implica dizer que, constitui uma garantia inalienável ao acusado em qualquer processo criminal não poder ser ele condenado sem estar presente e - principalmente - tomar ciência pessoal das acusações que contra si pairam.

Países - atualmente - como a Alemanha, Noruega, Suíça, Inglaterra, Holanda, Canadá, Uruguai, Argentina e Chile, entre outros, já consagraram tal entendimento não admitindo o prosseguimento do processo e o respectivo julgamento à revelia. O que vale, por outras palavras, dizer: somente quando o réu, citado e com o conhecimento das acusações contra si atribuídas se desinteressar ou não se defender, é que terá prosseguimento do feito com o posterior julgamento da lide.

Do mesmo modo, O Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos, aprovado pela Assembléia Geral da ONU, atualmente em vigor desde 23/03/76, pelo seu art. 14, nº 3, alínea "a", estabeleceu que toda a pessoa acusada de infração penal tem direito a ser imediatamente informada em língua conhecida e de forma detalhada acerca dos motivos e natureza da acusação (cfe. Compilação das normas e princípios das Nações Unidas em matéria de prevenção do crime e da justiça penal, in Procuradoria-Geral da República, Lisboa, 1995, p.436).

Nestas circunstâncias como se vê, a tendência mundial relativamente à observância do princípio do contraditório em toda a sua plenitude é entendimento já consolidado cabendo ser devidamente observado e seguido.

Uma outra observação que se impõe, sobre o advento da nova disposição, diz respeito, entendo, a um desgaste natural da estrutura judiciária e que tem passado despercebido e que, ante a contumácia do acusado, se vê na obrigação de envidar todos os esforços para a sua localização - na maior parte das vezes, inutilmente - redundando, posteriormente, numa precária instrução sobre os demais atos processuais e numa nem sempre eficaz decisão final sobre a questão jurídica, objeto da acusação feita ao réu ausente.

Na verdade, entretanto, o prejuízo - sem dúvida fundamental - é aquele que diz respeito à regular busca da verdade real, pois, não poucas vezes, é através dos elementos informativos trazidos com as declarações do próprio réu que o julgador chega à efetiva verdade sobre os fatos.

Feitas essas iniciais considerações, passo, agora, então, à análise das questões suscitadas com o advento da nova disposição constante do prefalado art. 366 na nova redação que lhe foi dada pela Lei nº 9271/96.

Primeiramente, é importante registrar que a nova disposição normativa contém implicações de natureza processual e material ou com efeitos materiais.

Assim, no que pertine à suspensão do processo, por óbvio, tem a norma natureza processual porque irá regular, dispor sobre o desenvolvimento e a tramitação do processo, enfim, sobre a regularidade daquele.

Já quando se reporta à suspensão da prescrição, indubitavelmente, o seu caráter é de índolematerial ou substantiva.

No que tange ao caráter processual (art.2º do C.P.P.), a norma ora em vigor, tem aplicação imediata e cogente, colhendo o processo na fase em que se encontrar sem prejuízo - naturalmente - dos atos processuais já praticados. Isto eqüivale a dizer, a norma de cunho processual, aplica-se desde logo ao processo em curso, não atingindo, entretanto, a integridade dos atos processuais (interrogatório, inquirição de testemunhas, etc.) já efetuados e cuja validade são incontestáveis, gerando efeitos jurídicos.

Desta maneira, tendo já sido decretada a revelia em determinado processo, não poderá, obviamente, o juiz torná-la sem efeito em face do advento da nova disposição normativa, excetuada, é claro, a possibilidade do ingresso a qualquer tempo do acusado no processo, afastando desse modo a sanção processual que lhe foi aplicada.

Nesse sentido, preleciona o douto JOSÉ FREDERICO MARQUES, verbis:

"...não se aplica a fatos passados, quer para anular os efeitos que j[a produziram, quer para tirar, total ou parcialmente, a eficácia de seus efeitos ulteriores derivados desses fatos pretéritos" (In "Elementos de Direito Processual Penal", 1a. ed.São Paulo : Forense, 1961, págs.44/45, 1º vol.).

No mesmo sentido, é o entendimento do preclaro DAMÁSIO E. DE JESUS, que assim se expressa, verbis:

"...o legislador pátrio, no problema da eficácia temporal da lei processual penal, adotou o princípio de sua aplicação imediata. Não tem efeito retroativo, uma vez que, se tivesse, a retroatividade anularia os atos anteriores, o que não ocorre". ( In, "Código de Processo Penal Anotado", 7a. ed., São Paulo : Saraiva, 1989, p.3).

Resta assim inequívoco que, as normas de feição ou cunho processual, embora de aplicação imediata, não terão incidência retroativa, ou seja, com capacidade para desconstituirem situações já consolidadas sob o império da lei anterior.

Todavia, o que - ao que tudo indica - tem suscitado maior controvérsia jurídica, é a parte da disposição normativa que se refere ao seu aspecto material, qual seja, aquela que se refere à suspensão do curso do prazo prescricional.

Ora, por evidente, numa primeira interpretação, a aplicação imediata da lei no que tange ao aspecto material do art. 366 - sustação do prazo prescricional - às infrações cometidas antes do advento da nova lei, é absolutamente maisgravosa do que a disposição anterior ( novatio legis in pejus ) e, por força de mandamento constitucional e da própria lei penal não poderia ser aplicada . (art.5º, XI, da CF e art.2º, parágrafo único do Código Penal ).

Esse entendimento acerca da irretroatividade da lei penal mais severa, já está consagrado na doutrina e na jurisprudência pátrias, desmerecendo, portanto, maiores considerações.

Entretanto, a meu sentir, entendo que se pode interpretar a aplicação do art. 366 no que tange à sustação do prazo prescricional de forma diferente.

Com efeito, é entendimento consolidado que as noções acerca da suspensão do processo, estão intimamente relacionadas com àquelas relacionadas com a prescrição, a qual, resulta justamente do andamento daquele. Assim, por exemplo, a prescrição retroativa, por exemplo, a mais corrente, tem incidência quando há nefasta morosidade no andamento do processo, seja já nos seus primórdios (antes do recebimento - até - da denúncia ), seja, após a deflagração da ação penal até a sentença final. Por conseguinte, qualquer circunstância que vá atuar ou sustar o andamento regular do processo, paralisando-o ou impedindo-o de tramitar regularmente, ocasionará - inexoravelmente - a chamada prescrição retroativa. Diga-se de passagem, o mesmo ocorrerá, quando se tratar da prescrição executória (trânsito em julgado da decisão para ambas as parte - defesa e Ministério Público, ou no caso deste último, na hipótese do § 1º do art. 110 do Código Penal).

Nesta conformidade, se aplicada literalmente a nova disposição da lei citada quanto ao artigo 366, não se poderá, evidentemente, aplicar a parte que lhe é material, ou seja, a parte relativa à suspensão do prazo prescricional pois, como já se disse, feriria o princípio da irretroatividade da lei penal mais grave prevista no texto constitucional.

Contudo, numa interpretação teleológica da nova disposição, verificar-se-á que, por certo, não foi intuito ( e creio sinceramente nem poderia sê-lo ) do legislador pátrio estabelecer desigualdade entre os sujeitos processuais, entre o acusado e o órgão do Ministério Público ou, em outras palavras, entre a defesa e a acusação.

Assim, tendo em vista a íntima conotação substantiva e processual existente entre os dois institutos - a suspensão do processo e a suspensão do prazo prescricional -, a interpretação acerca da aplicação do dispositivo será aquela que pautar-se pela aplicação integral da nova norma legal. E explico porque: a sustação do prazo prescricional, a meu ver, só seria prejudicial ao réu ou acusado - tão-somente - se não houvesse uma correspondente sustação do próprio processo, o que, por certo seria uma heresia jurídica suspender-se o prazo prescricional sem uma correspondente suspensão no curso do processo. Do mesmo modo, inegável prejuízo teria o réu se, já estando para se consumar a prescrição pela pena em abstrato, por exemplo, segundo a previsão do art. 107, IV c/c art. 109, ambos do Código Penal, tivesse contra si determinada a suspensão do processo sem que o tempo anterior decorrido pudesse ser somado àquele que sucedesse posteriormente quando fosse capturado ou preso a mando judicial. Ou seja, mais claramente: se faltando pouco tempo para operar-se a prescrição, aquele lapso temporal, até então decorrido antes da suspensão do processo ordenada, não fosse computado (ou somado) ao tempo decorrido depois com o reinicio do andamento do processo. Aí sim, poder-se-ia falar-se em prejuízo ao acusado. Ora, em determinado processo que esteja em curso e no qual já tenha sido ordenada a revelia do acusado, a nova aplicação do artigo mencionado irá paralisar o processo, impedindo venha aquele ser condenado sem ter tido a possibilidade de ser ouvido e, também, por outro lado, impedirá o curso inexorável da prescrição. Se, eventualmente, o acusado revel vier a ingressar no processo ou, vir a ser preso, aí - naturalmente - retomará o feito o seu curso normal sem prejuízo à acusação e - evidentemente - sem prejuízo à defesa. O que não se pode - evidentemente - sem prejuízo à própria ordem do processo e à teoria geral do processo já consagrada por nós, estabelecer critério interpretativo diverso, criando uma situação insensata e desigual no tratamento processual entre as partes.

Ademais, não obstante as opiniões ponderáveis do segmento doutrinário nacional no sentido de que a incidência da nova disposição legal deva ser parcial, ou seja, incidindo, apenas, na sua parte processual, a meu ver, tal entendimento fere substancial o disposto no art. 5º do estatuto magno que, explicitamente, estabelece a igualdade de todos perante a lei e, isto, por óbvio, abrange não somente a igualdade política (votar e ser votado), mas, também e sobretudo, a igualdade jurídica ou processual (isonomia de tratamento jurídico) fruto que é do sistema acusatório abraçado pelo legislador ordinário nacional quando da edição do texto processual penal.

Por esse sistema, como assinala o douto JULIO FABRINI MIRABETE, in "Processo Penal", 2a. ed., São Paulo: Atlas, p.41, um dos traços "profundamente marcantes do sistema acusatório" é a circunstâncias das partes (leia-se: acusado e acusador) em razão do princípio do contraditório, estarem no "mesmo pé de igualdade", competindo-lhes, portanto, os mesmos direitos e deveres no processo.

Aquela igualdade processual a que me referi, portanto, é que irá sinalizar os direitos de cada uma das partes dentro do processo, seja no tocante aos atos por elas requeridos, seja no que pertine ao exercício do próprio direito do Ministério Público quanto à pretensão punitiva da qual é titular, seja - por fim - no próprio exercício do amplo direito de defesa por parte do acusado no âmbito processual.

Ora, se isso é verdade já consagrada no cenário doutrinário nacional, não emerge jurídica a interpretação ultra benéfica que se pretende dar ao mencionado art. 366 do C.P.P. com a nova redação que lhe foi dada pela lei já citada, porque, na verdade, tal interpretação não corresponde aos fundamentos básicos do processo penal estruturados que foram segundo os princípios do contraditório (igualdade de oportunidade, direitos e deveres para ambas as partes) e ampla defesa correspondente.

2. Do recurso cabível contra a decisão que decreta ou não a suspensão do curso prescricional.

A meu ver, a aplicação da nova disposição processual penal inserida no art. 366, vai gerar - como já está gerando - no cenário jurídico e forense, acirradas discussões jurídicas e díspares.

Para alguns, o recurso cabível da decisão que decreta a suspensão do prazo prescricional ( ou, a que não a decreta), é o recurso em sentido estrito por aplicação extensiva e analógica ( art. 581, XVI c/c art. 3º, do C.P.P.), e, outros, pugnam pela admissibilidade do recurso de apelação (art. 593, II do C.P.P.). Há, entretanto, aqueles que pugnam pela adoção de recurso regimental ( reclamação ou correição parcial ), previsto em Regimento Interno dos seus respectivos Tribunais Estaduais.

Data vênia, de alguns dos respeitáveis entendimentos existentes, entendo que a hipótese mencionada, na verdade, está a ensejar o recurso de Reclamação (ou Correição Parcial), como adiante se aduzirá, previsto em alguns regimentos internos de nossos Tribunais, o qual é utilizado na ausência de recurso próprio para determinado caso concreto.

Primeiramente, penso que para inclinar-se por um ou outro caminho recursal, deve o intérprete antes de mais nada, perscrutar a essência da decisão contra a qual será dirigida o recurso adotando, posteriormente, então, o recurso que lhe pareça - processualmente - mais correto.

Segundo o magistério do preclaro - FERNANDO DA COSTA TOURINHO FILHO, in "Processo Penal", 15a. ed., São Paulo : Saraiva, 1994, págs.180 e ss., os atos jurisdicionais penais (art.800 e arts.581 e 593, I e II do C.P.P.) podem ser agrupados do seguinte modo: 1) decisões (sentido lato sensu): a) interlocutórias simples e b) interlocutórias mistas ou decisões com força definitivas que, por sua vez, podem ser - terminativas e não-terminativas; c) definitivas: condenatórias, absolutórias - próprias e impróprias -, e definitivas em sentido estrito; e, 2) despachos de expediente.

Com base nesta classificação, parece-me, é possível verificar se a decisão que decreta ou não a suspensão do processo ou, tão-somente, a suspensão do curso da prescrição, enquadra-se numa daquelas categorias de decisões que, então, justificariam a adoção do recurso correspondente.

Primeiramente e, por exclusão, vê-se desde logo, que a decisão que se está analisando, por não julgar o mérito do processo (ou seja: acerca da pretensão punitiva do Estado), não tem características de definitivas sob qualquer das variantes acima enumeradas.

Por outro lado, igualmente e, por óbvio, não tem ela características nem forma dos chamados despachos de expedientes, porque esses, como sabido, destinam-se simplesmente a impulsionar o processo ou determinar a movimentação do mesmo.

Restam assim, então, a categoria das decisões interlocutórias - simples ou mistas para um possível enquadramento do tipo de decisão de que se está tratando.

Ora, as interlocutórias simples, como acentua TOURINHO FILHO, são aquelas que se referem a " algumas questões emergentes relativas à sua regularidade ou marcha que exigem maior exame...". Como exemplo, cita o eminente tratadista as decisões relativas ao "recebimento da denúncia ou queixa, a decretação da prisão preventiva ou o indeferimento com o mesmo objetivo, a que desacolhe a alegação de ilegitimidade de parte..." entre outras. (ob. cit.p.180).

Já no que se relaciona com as decisões interlocutórias mistas ou com força de definitiva, o mesmo autor assinala que "são aquelas que encerram a relação processual sem julgamento do mérito ou, põem termo a uma etapa do procedimento". Quando elas trancam o processo sem resolver o mérito, tem-se "as decisões interlocutórias mistas terminativas" e, como exemplo, alinha o autor "a que acolhe a exceção de coisa julgada, a que acolhe a exceção de litispendência, a que rejeita a denúncia ou queixa, a que julga ausente condição de procedibilidade".(ob. cit. p.181).

Quando "ela não julga, não impede o fluir da relação processual, apenas pondo fim a uma fase do procedimento, fala-se em decisão interlocutória mista não terminativa" de que é exemplo, então, a decisão de pronúncia.

Vê-se que, a rigor técnico, a decisão que suspende o prazo prescricional segundo a nova dicção do art. 366 do Código de Processo Penal, embora não possa, necessariamente, ser enquadrada como uma decisão interlocutória mista, constitui um ato jurisdicional que envolve um juízo de valor acerca da interpretação do instituto da prescrição que, no caso, poderá prejudicar ou beneficiar o acusado.

Nesta conformidade, tendo o juiz determinado - também - a suspensão do prazo prescricional através do entendimento de que, na verdade, não há prejuízo para o réu, já que suspenso igualmente o curso do processo, tal decisão, encerra, a meu ver, um juízo acerca de uma matéria de direito material, passível, portanto, de reexame pela segunda instância.

Verificada, portanto, a natureza da decisão em comento, constata-se que, primeiramente, em princípio, poderia ela ser atacada através do recurso em sentido estrito (antigo agravo) caso o art.581 do Código de Processo Penal contivesse - pelo menos - uma hipótese que guardasse alguma semelhança com o tipo de decisão que se está examinando. Se assim fosse, por óbvio, aplicar-se-ia o art. 3º, do estatuto processual que admite a interpretação analógica. Entretanto, não obstante o caráter interlocutório misto da mencionada decisão, não se pode, evidentemente, forçar uma interpretação analógica apenas tendo por base alguma das características do ato jurisdicional expedido, mas sim, levando em conta o fato, objeto da relação de direito em razão do qual foi editada a decisão e, contra o qual, intenta-se - agora - o recurso.

Em outras palavras, se o fato decidido guarda identidade ou afinidade com outro, objeto da decisão contra a qual se irá recorrer, aí, então, poder-se-á analogamente aplicar a mesma disposição legal que prevê o recurso, no caso o recurso em sentido estrito.

Por outro vértice, como iterativamente se tem decidido, a redação da norma insculpida no art. 581, do Código de Processo Penal, é taxativa e não exemplificativa, o que vale dizer, somente os casos nela (na norma) previstos, admitirá o manejo do citado recurso.

Neste sentido, vejam-se os julgados constantes das Rts. nºs. 632/295; 525/344; 565/309; 602/371 entre outras, não obstante, hajam arestos em contrário como por exemplo, os constantes das RTs. nºs. 551/332; 588/425; 592/441-2; 601/446; 607/410 entre outros.

Por outro lado, a meu ver, como já salientei, a decisão ora em estuda, está a desafiar o instituto da Correição Parcial, também conhecida em algumas unidade federadas por Reclamação.

A Correição Parcial, emergiu no cenário jurídico nacional no ano de 1911, pelo Decreto nº 9.623, que objetivava disciplinar a organização judiciária do antigo Distrito Federal, passando, posteriormente, a ser chamada de Reclamação pela Lei nº 1.301, de 28/12/50. conforme assinala a ilustrada Profa. ADA PELLEGRINI GRINOVER et alii, in "Recursos no processo penal: teoria geral dos recursos, recursos em espécie, ações de impugnação", São Paulo : Editora Revista dos Tribunais, 1996, p.254.

Num primeiro momento da sua existência, conforme assinala a citada professora, a correição parcial ou reclamação, foi alvo de controvérsias no cenário jurídico nacional, sendo considerada, por vezes, uma medida de caráter disciplina, em outras, como um "recurso supletivo", um "procedimento disfarçável", "recurso clandestino"etc (ob. cit. p.255), até se firmar comoverdadeiro recurso.

Hoje, evidentemente, já não há mais dúvidas sobre a sua essência jurídica que é - verdadeiramente - de recurso contra as decisões ou despachos jurisdicionais, assentadas em erro ou abuso por parte do magistrado e que resulte em inversão tumultuária no processo e para as quais não haja previsão recursal.

No que diz respeito ao pressuposto - erro -, tem se entendido que é a interpretação errônea da disposição legal feita pelo juiz ou, ainda, a equívoca visão acerca do fato material objeto da relação de direito. Já o abuso, consiste num agir extra-legal, numa atitude de desprezo para com a norma legal e denotando excesso de poder.

No caso em pauta, entendo que a decisão (no sentido genérico) desfundamentada acerca da suspensão do prazo prescricional, constitui - fundamentalmente - erro na interpretação do instituto de direito material que tem por base, por certo, equívoca apreciação da questão de direito submetida à análise do juiz e que poderá, inclusive, trazer prejuízos futuros ao réu ou à própria acusação em termos de obtenção de um juízo condenatório.

É evidente, por outro ângulo, que a matéria inicialmente decidida pelo juiz, seja em que direção for ( suspensiva ou não do prazo prescricional) poderá ser suscitada como preliminar - por qualquer das partes - em grau de recurso após a decisão final a ser de qualquer modo prolatada no processo.

Por último, tratando-se de questão recente que veio a lume com o novo diploma legal, os Tribunais pátrio, naturalmente, deverão enfrentar a questão que fatalmente a eles será submetida em grau de recurso e, desse modo, futuramente, ter-se-á uma posição consolidada em termos jurisprudenciais.


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